
Considerada vital para a integração logística da Amazônia Ocidental, rodovia que liga Porto Velho (RO) a Manaus (AM) começa a ser asfaltada em trecho crítico, após intensa pressão política e acordo ambiental inédito.
PORTO VELHO, RO – Um dos projetos de infraestrutura mais aguardados e debatidos da Região Norte está, finalmente, saindo do papel. Após mais de quatro décadas de abandono e intensas disputas envolvendo questões ambientais, logísticas e econômicas, as obras de repavimentação com asfalto da BR-319 foram oficialmente retomadas. O início dos serviços no Trecho C, um dos mais sensíveis, reacende a esperança de milhares de moradores e impulsiona o debate sobre o futuro da Amazônia.
A rodovia BR-319, com aproximadamente 876 quilômetros, é a única ligação terrestre direta entre Manaus, capital do Amazonas, e o restante da malha rodoviária nacional, via Porto Velho, em Rondônia. Construída na década de 1970, a estrada se deteriorou rapidamente com o tempo, transformando-se em um corredor de lama intransitável durante grande parte do ano. O isolamento logístico de Manaus, que depende quase que exclusivamente de transporte fluvial e aéreo, tornou a revitalização da BR-319 uma bandeira política e econômica histórica para a região.

O Impasse e o Acordo
O grande obstáculo para a pavimentação sempre foi o licenciamento ambiental. A rodovia corta uma das áreas mais preservadas da Amazônia, entre os rios Madeira e Purus, e ambientalistas alertam há anos que o asfaltamento pode acelerar o desmatamento, a grilagem de terras e a pressão sobre terras indígenas e unidades de conservação.
O avanço só foi possível após um "acordo inédito", como classificou o governo, entre os Ministérios dos Transportes e do Meio Ambiente. O entendimento resultou na elaboração de um **Plano Socioambiental Estruturado**, um pacote de medidas de mitigação e compensação que inclui a implementação de bases de vigilância, reforço no combate ao desmatamento ilegal e programas de apoio às comunidades tradicionais. Esse plano foi a condição para que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedesse as licenças necessárias para o início da obra.
A Retomada das Obras e a Pressão Política

A retomada concreta se deu com o início dos serviços no Trecho C, que compreende os quilômetros 198 a 218, a partir de Manaus. Esta etapa é considerada crucial por ser um dos trechos mais degradados e de maior complexidade ambiental.
Por trás do destravamento do processo, há uma forte pressão política. A deputada federal Cristiane Lopes (União-RO), presidente da Frente Parlamentar em Defesa da BR-319, foi uma das vozes mais ativas. Em julho, durante uma audiência pública na Câmara dos Deputados, ela confrontou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, cobrando agilidade nas licenças.
"A pressão deu resultado. A mobilização do nosso mandato, junto às comissões técnicas, por meio de ofícios e visitas aos ministérios, ajudou a destravar um impasse que já se arrastava há anos. Agora precisamos de um cronograma claro e compromisso com a conclusão da obra. O povo de Rondônia e do Amazonas não pode mais esperar", declarou a parlamentar.
Além das cobranças diretas ao governo federal, a deputada articulou apoio no Fórum dos Governadores da Amazônia Legal, conseguindo uma declaração conjunta em defesa da obra, e acompanhou a destinação de R$ 180 milhões em recursos para o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), órgão responsável pela execução.
Os Próximos Desafios
Apesar do avanço no Trecho C, o caminho até a conclusão total da pavimentação ainda é longo e cheio de desafios. O trecho central da rodovia, que é o mais extenso e ambientalmente sensível, ainda enfrenta entraves judiciais e depende da conclusão bem-sucedida de todas as etapas do plano socioambiental.
Para defensores da obra, a BR-319 vai muito além do asfalto. Ela simboliza a redução drástica do custo de vida em Manaus – onde produtos chegam a custar o dobro do valor de outras capitais –, a integração de comunidades isoladas, o escoamento da produção regional e a quebra de um isolamento histórico.
"Essa rodovia é vital para reduzir custos logísticos, integrar estados, escoar a produção e dar dignidade a quem vive no Norte. Essa luta é histórica e nós não vamos recuar", reforçou Cristiane Lopes.
A expectativa agora é que a retomada no Trecho C sirva de catalisador para destravar os demais setores da obra, transformando a BR-319, após tantas promessas, em uma realidade que una desenvolvimento e preservação na maior floresta tropical do mundo.
Fonte: Redação