Um dos ataques podem ter resultado na destruição da casa na qual vivia a brasileira Fatima Boustani, com quatro filhos, na cidade de Saddikine
Na resposta enviada à reportagem, Tel Aviv disse ter realizado no sábado "um ataque contra um centro de comando e controle militar do Hezbollah na área de Saddikine, no sul do Líbano" -ou seja, nas mesmas localidade e data em que Boustani foi ferida. Devido a uma suposta falha, o ataque pode ter ocorrido "em uma área diferente do alvo designado" e, por isso, "o incidente está sob análise".
Boustani foi internada em estado grave e continuava em uma UTI, mas na segunda-feira (3) passou a respirar sem ajuda de aparelhos, segundo um tio dela, Jihad Azzam. A filha Zahraa, 10, que passou por uma operação bem-sucedida na perna, saiu da UTI no domingo (2) e ainda está hospitalizada, enquanto o filho Ali, 9, que havia sofrido ferimentos leves, foi liberado na segunda.
Nesta quarta-feira (5), Boustani foi transferida para um hospital na capital libanesa, Beirute, segundo disse à Folha seu tio, Jihad Azzam. Segundo ele, os médicos tomaram a decisão para que ela receba um tratamento mais adequado. A família de Boustani disse que espera melhorias nas condições de saúde dela e na segurança da região para transferi-la a um hospital no Brasil.
A cidade em que a família vive fica em uma área a partir de onde o Hezbollah tem realizado ataques contra o território israelense, usando mísseis e foguetes. Um desses ataques provocou na segunda (3) um incêndio que levou 48 horas para ser controlado e consumiu 15 km², obrigando o governo de Israel a remover 70 mil pessoas de sua faixa de fronteira.
No Brasil, o Itamaraty protestou com indignação contra o ataque que atingiu a cidadã brasileira, pedindo a Israel "máxima contenção" em suas ações. A nota da chancelaria, porém, não responsabilizava expressamente Tel Aviv pelo ocorrido. Dizia que o episódio havia ocorrido "no contexto de ataques das Forças Armadas israelenses no sul do Líbano, e do Hezbollah no norte de Israel".
Desde o início do conflito com o Hamas, em 7 de outubro, a Procuradoria de Justiça Militar de Israel já abriu pelo menos 70 investigações formais por crimes de guerra possivelmente cometidos por suas forças. Além disso, o país está sendo julgado na Corte Internacional de Justiça por uma denúncia de genocídio contra os palestinos, feita pelo governo da África do Sul.
Em outra frente, o TPI (Tribunal Penal Internacional) analisa um pedido de prisão feito no dia 20 de maio pelo procurador do tribunal, Karim Khan, contra o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, e seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, por privar palestinos de alimentos, como um método de guerra. Na mesma solicitação, Khan pediu a detenção de três líderes da facção terrorista Hamas.
De acordo com o Direito Internacional Humanitário -conjunto de normas que regulam os meios e métodos de guerra e protegem certas categorias de pessoas-, os civis devem ser poupados dos efeitos do conflito e não podem, jamais, serem tomados como alvos deliberados de ataques. A lei deixa, no entanto, margem para justificativas de dano colateral, entre outras.
Com base nessas brechas, a defesa jurídica israelense argumenta que as mortes de civis em Gaza e em outras frentes, como no sul do Líbano, não resultam de ataques deliberados, mas de danos colaterais ou de erros técnicos, como o que pode ter vitimado a brasileira Boustani.